REUTERS/Carla Carniel/Direitos reservados

Bolsonarismo e seu partido militar golpista mais uma vez tentam silenciar a vontade popular por meio da violência e opressão

Não é fácil apresentar análise que apreenda a totalidade do fenômeno ocorrido naquela tarde de 08 de janeiro. O texto que segue, portanto, é somente reflexo de impressões parciais e precárias sobre o sentido político do ataque bolsonarista.

De início, deve-se chamar a atenção para a imprevisibilidade das consequências do ataque político da direita. O Governo Lula mal começou. Do ponto de vista da institucionalidade da administração, ainda há certa precariedade em apresentar com clarezas as diretrizes do novo governo. Fruto de uma frente ampla com diversos setores da direita, conta com natural dificuldade de encontrar projetos em comum. A precariedade da operação política de Lula para governar inevitavelmente leva a fissuras, que podem desencadear em fraqueza e debilidade política.

Portanto, o ato golpista de 08 de janeiro de 2023 atinge um governo ainda inicial, já com grandes dificuldades políticas.

Analisando os fatos com lentes mais precisas, é muito difícil não perceber que estamos sofrendo uma tentativa clara de golpe militar, em evidente ataque ao povo brasileiro, como historicamente age o militarismo no Brasil.

A partir da perspectiva da luta de classes no Brasil, os militares são o braço armado e a mão amiga das classes dirigentes. O povo, do Brasil profundo e oprimido, nunca pode contar com os militares ou suas forças auxiliares, que rotineiramente adentram favelas, matam trabalhadores e alegam que se confundiram, sem nenhuma consequência para os assassinos. Aliás, o povo brasileiro nunca pode contar com nada, com nenhuma instituição ou coisa que o valha, como já ensinava Darcy Ribeiro.

O protofascista Bolsonaro, até 2018 uma espécie de sindicalista militar, possui, portanto, profunda relação com as pretensões políticas do militarismo. Não é demasiado lembrar o que pensa este grupo: no momento do seu voto a favor do golpe contra a presidenta eleita Dilma, Jair fez clara apologia ao preposto de ditador e torturador Brilhante Ustra.

Mas se aprendemos direito alguma coisa sobre a real política brasileira, havemos de intuir que a classe militar não paira no ar sem um pilar real de sustentação de classe: a burguesia detentora do capital.

No ataque da direita em 08 de janeiro, houve claramente apoio explícito dos militares. Conforme noticiado, inclusive em sites bolsonaristas[1], existe um batalhão militar com aproximadamente mil homens que possui a função de proteger o palácio do planalto. Interesse notar que, ainda quando o golpista Temer era presidente, o referido batalhão protagonizou o chamado “Plano Scooby”[2], que consistia em operação para proteger o palácio contra eventuais protestos, pois, na época, Michel amargurava elevado desprezo popular e teve medo que a situação fugisse ao seu controle.

Não devemos também cair em tentação de confiar cegamente nas instituições brasileiras, que certamente contam com vários membros bolsonaristas radicais: a começar pelo próprio governador do Distrito Federal e de seu secretário de segurança pública (ex-ministro de Bolsonaro).

Nesse sentido, Mauro Iasi nos exorta:

O mesmo pode ser dito da complacência bovina com a qual a estrutura judiciária brasileira vê os termos da reforma trabalhista, a chacina diária das diferentes políticas de segurança pública transformadas em máquinas de extermínio de jovens negros e de matéria-prima para o encarceramento contra todos os dispositivos previstos na legislação específica, como a Lei de Execuções Penais, a Constituição Federal e os tratados que definem o respeito aos direitos humanos. O que se evidencia é a constatação, brutal e explícita, que não há nenhum fundamento para o direito, nem no corpo mítico de supostos direitos naturais, nem na abstração de patamares civilizatórios, que não seja a luta de classes e a materialidade das relações sociais que constituem a base real da forma jurídica (IASI, 2019, p. 43

Em que pese não termos bola de cristal, nem ignorar a complexidade extrema da situação política atual, ao que tudo indica, se o Lula e o povo não agirem na defesa de sua opção política, que foi vitoriosa, ainda que meramente eleitoral, veremos mais um golpe contra o povo, tal qual em 2016.

Foto: Nelson Almeida/AFP

Referências

IASI, MAURO LUIS. Cinco teses sobre a formação social brasileira. SERVIÇO SOCIAL & SOCIEDADE, v. 136, p. 417-438-438, 2019.

[1]https://brasilsemmedo.com/onde-estava-o-batalhao-da-guarda-presidencial-durante-a-depredacao-do-palacio-do-planalto/

[2]https://www.metro1.com.br/noticias/brasil/35710,exercito-pratica-plano-contra-invasoes-no-planalto

 

André Luís Jacomin. Formado em direito. Possui interesse em criminologia, sociologia e política.